Friday, April 18, 2008

Da insustentável leveza do ser

"O mais pesado fardo nos esmaga, nos faz dobrar sob ele, nos esmaga contra o chão. Na poesia amorosa de todos os séculos, porém, a mulher deseja receber o peso do corpo masculino. O fardo mais pesado é, portanto, ao mesmo tempo a imagem da mais intensa realização vital. Quanto mais pesado o fardo, mais próxima da terra está nossa vida, e mais ela é real e verdadeira. (...) Tomás pensava: deitar com uma mulher e dormir com ela, eis duas paixões não somente diferentes mas quase contraditórias. O amor não se manifesta pelo desejo de fazer amor (esse desejo se aplica a uma série inumerável de mulheres), mas pelo desejo do sono compartilhado (este desejo diz respeito a uma só mulher) [...] O sono compartilhado era o corpo de delito do amor"

In: Kundera, A insustentável leveza do ser

Thursday, April 10, 2008

Da poesia televisionada

Estava dormindo. No sonho, uma voz masculina declamava uma poesia com uma música ao fundo. Abri os olhos, ainda semicerrados, reconheci Oswaldo Montenegro na tela da TV, violão e microfone, voz doce e olhos fechados, dizendo: "E que a minha loucura seja perdoada. Porque metade de mim é amor e a outra metade também". Levantei repetindo a frase na cabeça. Google: "E que a minha loucura seja perdoada. Porque metade de mim é amor e a outra metade também". Eis o poema na íntegra:
"Que a força do medo que eu tenho, não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo o que acredito não me tape os ouvidos e a boca.
Porque metade de mim é o que eu grito, mas a outra metade é silêncio...
Que a música que eu ouço ao longe, seja linda, ainda que triste...
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada mesmo que distante.
Porque metade de mim é partida mas a outra metade é saudade .
Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece, e nem repetidas com fervor, apenas respeitadas, como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos.
Porque metade de mim é o que ouço, mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que eu mereço.
E que essa tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada.
Porque metade de mim é o que eu penso mas a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste, e que o convívio comigo mesmo, se torne ao menos suportável. Que o espelho reflita em meu rosto, um doce sorriso, que me lembro ter dado na infância.
Porque metade de mim é a lembrança do que fui, a outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria para me fazer aquietar o espírito.
E que o teu silêncio me fale cada vez mais.
Porque metade de mim é abrigo, mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta, mesmo que ela não saiba.E que ninguém a tente complicar porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer.
Porque metade de mim é platéia, e a outra metade é canção.
E que a minha loucura seja perdoada.Porque metade de mim é amor, e a outra metade... também..."
Depois de conhecer a música da bailarina na voz dele, Oswaldo Montenegro me encantou mais uma vez, dez anos depois...